Quando falamos sobre sustentabilidade na arquitetura brasileira, nos remetemos a uma representação quase unânime de uma edificação com conforto térmico e lumínico, reaproveitamento de águas cinzas, captação de energia solar, coleta seletiva e compostagem.
É comum nos direcionarmos para esta representação, pois, de fato, ela representa um pouco dos processos e práticas de construção sustentável existentes. Porém, existe um intervalo enorme entre esses conceitos e o seu processo de aplicação para que eles sejam executados de maneira fiel e real.
Dá para contar nos dedos a quantidade de obras que cumprem os requisitos básicos para uma construção ecologicamente correta e com respeito ao meio ambiente.
Isso se dá por diversos motivos: falta de aprofundamento e de interesse da maioria dos profissionais de arquitetura e engenharia civil acerca desses princípios e práticas; falta de investimento público/privado em soluções construtivas limpas e com baixo custo.
Falta de mão de obra qualificada e de interesse por parte da população em fazer algo que fuja dos padrões estéticos impostos nas paisagens construídas das cidades brasileiras por dinâmicas meramente contratuais.
Fora da linha convencional da construção civil existem, por exemplo, os métodos de arquitetura vernacular, que buscam trazer todo o conhecimento empírico obtido por anos.
Às vezes, séculos de práticas em construções que se utilizam de materiais naturais para erguer paredes e coberturas. No Brasil, podemos mencionar vários exemplos desse tipo de arquitetura, como blocos de solo prensado, estruturas de pau-a-pique, taipa de pilão, adobe, entre outros.
Por mais que estejam disponíveis métodos e formas variadas para levar a construção civil a um patamar de proteção e respeito ao meio ambiente, o fator da educação da sociedade é o mais importante.
Sem a população ter o mínimo de conhecimento sobre essa temática, os profissionais de arquitetura e engenharia se veem presos a replicar processos convencionais e mais “práticos”.
Isso leva a um bloqueio na difusão de métodos mais inovadores, tecnológicos e com baixo impacto ambiental que, por consequência dessa exclusividade autoimposta, atinge valores altos e com pouca gente capacitada para sua execução. Ou seja, apenas a população com alta renda consegue dispor de tais métodos.
Se olharmos a partir de uma perspectiva aproximada, são pífios os números de construções feitas a partir de processos próximos ao vernacular, executadas de maneira desafiadora devido à falta de mão de obra especializada e de matéria-prima própria para esses processos, replicando os mesmos problemas que observamos com a implementação de métodos mais tecnológicos e artificiais.
Segundo dados do Conselho Brasileiro de Construção Sustentável (CBCS), o setor da construção civil consome 75% dos recursos naturais, 20% da água disponível nas cidades e gera 80 milhões de toneladas/ano de resíduos, sendo um dos principais responsáveis pelos impactos ambientais no mundo.
Como podemos projetar arquiteturas com qualidade construtiva e respeito ao meio ambiente?
A médio e longo prazo, é necessário reformar a educação do mercado profissional, iniciando uma revolução com mudanças assertivas e reais dentro e fora das universidades para dar continuidade e abrangência aos esforços pela atualização técnico-tecnológica e socioambiental que algumas instituições e atores sociais, solitariamente, vêm implementando.
Essa questão é de extrema importância, pois é na etapa de projeto que conseguimos simular diferentes soluções e entender o orçamento para levar as melhores estratégias à etapa de execução.
Os processos de projeto precisam ser melhor avaliados e trabalhados, uma vez que, na realidade da maior parte dos profissionais e escritórios de arquitetura brasileiros, que se tratam de profissionais autônomos ou com equipe reduzida, a confecção de cada obra fica a cargo e boa vontade de um determinado profissional.
Muitas vezes, esse profissional não segue escopo mínimo e não possui especialização em processos e responsabilidades realmente relevantes para este momento complexo em que vivemos.
A curto prazo penso que, se os projetos se apropriarem de métodos construtivos e soluções arquitetônicas corretas, conseguiremos mudar o funcionamento das edificações e prepará-las para o futuro de desafios.
Unir estrutura de concreto e alvenaria com isolante térmico, prever aquecimento e resfriamento passivos, alcançar um bom nível de entendimento de demanda e pouco retrabalho em projeto e obra, especificar materiais que, em sua composição, não tenham processos degradantes à natureza, otimizar a construção sobre o solo mantendo a permeabilidade.
Além de todos os métodos de captação de água e produção de energia limpa, e tudo isso executado com mão de obra do local, na escala da cidade ou de região próxima.
Ao tratar de processos mais sustentáveis e eficientes, são poucos os profissionais de Arquitetura e Engenharia que, realmente, os acessam.
Quando estendemos o olhar para o mercado imobiliário, construtoras e incorporadoras, percebemos que ainda existe uma desvinculação enorme entre a publicidade de determinados conceitos e valores e a sua real execução nos empreendimentos, pois a arquitetura projetada,em sua maioria, não prevê soluções para incorporação de tais métodos.
Infelizmente, não temos um panorama animador pela frente. Enquanto não mudarmos nossa forma de projetar, não teremos a implementação efetiva de processos mais sustentáveis e responsáveis com o meio ambiente.
Com isso, a indústria não se verá estimulada a investir em processos para grandes escalas e as políticas públicas ficarão a cargo da boa vontade de futuros gestores e políticos para a incorporação e implementação dessas medidas a um nível mais amplo.